Após quase 106 anos desde a chegada da família pioneira ao Brasil, no dia 17 de julho de 1918, a bordo do navio Wakasa Maru, esse grande Encontro da Família Sano foi realizado nos três dias do feriado da Páscoa, a partir de sexta-feira, 29 de março de 2024, e se estendendo até o dia 31, em dois locais determinados, Clube Tóquio e Termas de Água Viva, em Fernandópolis, a 550 km de São Paulo, cidade considerada como quase natal aos dessa grande família.
Quando a família pioneira desembarcou no Brasil, era composta por apenas 3 membros em condições de trabalho (mínima, na época, para uma família vir como imigrante) e quatro crianças. Passados quase 106 anos de Brasil, atualmente, sua prole já se aproxima de 300 pessoas vivas. Ao Encontro, dentre primos e respectivos agregados, de 0 a 85 anos de idade, 151 atenderam ao convite para participarem!
O evento principal ocorreu na noite de sexta-feira, na sede da ACE Fernandópolis, ou Clube Tóquio, local adequado, visto que o idealizador e um dos principais fundadores foi o primogênito da primeira geração, Tsuneshi Sano. Devido à distância e às idades avançadas de muitos da segunda geração, os meios de transportes utilizados por eles para participarem foram os mais variados, desde veículo próprio, ônibus-leito intermunicipal… e até avião.
A idealizadora dessa performance familiar foi a caçula da segunda geração, Paula Sano, filha do caçula da primeira, Paulo Sano, único dentre os irmãos não batizado com nome japonês. “Como recentemente, do meu lado materno, família Ogata, vínhamos realizando esses encontros familiares… e dando certo… realizamos quatro em anos seguidos… resolvi lançar a ideia também ao meu lado paterno, Sano, mas de número muito maior”, justificou. “O bacana é que para quem fui falando, todos, começaram a abraçar a ideia com entusiasmo… Rosa, Carlos, Mari, Célia…”, acrescentou. “Até que a Rosa entrou em contato com o Kazushi (Silvio), de São Paulo, para que fizesse o vínculo com o pessoal de lá e, com isso, a realização começou a tomar proporções inimagináveis para nós… e até assustadoras”, sorriu. “Sinceramente, não esperávamos a adesão de tantos primos e agregados. Ficamos imensamente feliz e compensados pelo resultado obtido com o encontro… e agora… que venham mais!”, concluiu com entusiasmo.
A história da Família despertou o interesse dos mais jovens às suas raízes
No Japão, de tradição milenar no que se refere à família, a questão da manutenção da linhagem para a continuidade da mesma, é extremamente forte. Por isso, muitas famílias, não apenas os de posses, até brasões tinham. As mais poderosas, que marcaram a história do país, os levavam como bandeiras de guerra às suas conquistas, como símbolos de poder.
Não foi o caso da família Sano, que tinha seu brasão, até por se localizar no pacato extremo norte e montanhoso da Província de Mie (Inabe-gun, Hokusei-chô), e até por isso, com mais respeito ainda à tradição da manutenção da linhagem familiar.
Como para a continuidade da linhagem é necessário que os filhos se casem e tenham filhos, a consequência foi o surgimento do Miyai (casamento arranjado), que ocorria quando os mesmos chegavam às idades adequadas para isso. Essa tradição se fez tão forte entre os japoneses que, mesmo atualmente, de ambas as partes, tanto dos pais quanto dos filhos, alguns ainda aderem a essa prática.
Outra consequência foi ao caso das famílias que tinham apenas filhas. Como a manutenção da linhagem era “sagrada” a qualquer família japonesa, surgiu a figura do Yooshi (marido adotivo), em que essas famílias (de apenas filhas) ofereciam altos dotes aos futuros maridos para que aceitassem abdicar de seus sobrenomes para assumirem os delas.
Foi o que ocorreu, no caso em questão, a Shinzô Katayama que, ao aceitar se casar com uma das filhas da família Sano, vizinha de onde moravam, passou a adotar o novo sobrenome. Ou seja, a origem real do Sano atual advém da família Katayama., da mesma região de Inabe-gun, em Mie.
Desse casamento nasceu, Tsuneichi, que gerou a atual prole Sano, que vive no Brasil. Mas a esposa de Shinzô veio a falecer e, de novo, em nome da linhagem, acabou se casando com outra das filhas, com quem teve Shigekazu, Yoshiro e Yoshimi.
Nenhum deles, por questão econômica, necessitava emigrar para o Brasil, mas devido ao primogênito Tsuneichi apresentar forte dependência à bebida alcoólica, no Japão, foi-lhe recomendado aproveitar o movimento emigratório que ocorria para o Brasil, na época, para tentar superar esse problema e retornar ao país em seguida. Assim, ficou decidido que iria para o Brasil com sua família.
Mas para vir ao Brasil como família imigrante era necessário que fosse composta por, no mínimo, três membros em condições de trabalho (ou acima de 12 anos). Então, combinaram que o irmão caçula, Yoshimi, com 14 anos, os acompanharia nessa missão, com Tsuneichi, tendo 30 anos, esposa Chiyo, 22, mais os filhos menores: Tsuneshi, 7 anos; Tsuneo, 5; Tsunehiro 3; e, Tamao 1 ano.
A viagem ao Brasil durou quase 3 meses (23/04/1918 a 17/07/1918) em alto-mar. Como era praxe jogarem ao mar os corpos dos que falecessem durante o percurso, isso quase ocorreu também à bebê Tamao, que veio a falecer no navio, mas por ter ocorrido às vésperas do desembarque no porto de Santos, conforme relatou, Tsuneo, segundo filho, conseguiram esconder o pequeno corpo dela com cobertores para a enterrarem em terra brasileira.
Desembarcados, seguiram os trâmites dos outros imigrantes japoneses, passando pela Hospedaria dos Imigrantes antes de serem encaminhados às fazendas que os reivindicaram.
Para Tsuneichi, isso durou pouco tempo, visto que a razão de sua vinda fora para acabar com a forte dependência alcoólica que tinha no Japão, o que não ocorreu após conhecer a pinga brasileira com a qual se apegou igualmente. Com isso, entre altos e baixos, ainda acabou acometido de malária, vindo a falecer 4/5 anos após sua chegada ao Brasil.
Mas nesse período ainda teve três filhos, Sumeikissa, Tamae e Paulo, deixando para sua esposa, com 27 anos e o irmão caçula, com 19, a responsabilidade para criarem seus seis filhos órfãos… todos, menores! Menos mal foi que o filho maior, Tsuneshi, acabara de completar 12 anos, podendo, portanto, já trabalhar. Assim, Yoshimi, com muita fibra e consciência de que a formação escolar era fundamental para superar todos os obstáculos que viriam à frente, levou-os até onde pudessem caminhar bem com os próprios pés.
Ele já viera com o ensino ginasial formado e, no Brasil, por sua maneira de pensar somada a uma convivência periódica numa colônia espanhola, aprendeu a falar e escrever a língua deles, tomando cada vez mais a noção de mundo para passar todo seu conhecimento, ele próprio, aos sobrinhos.
Mas antes de tudo, tinha de superar a parte econômica, para a sobrevivência nesse país ainda estranho a ele. Por isso a boa formação que tinha foi fundamental para que vencessem esses obstáculos até com facilidade. Mudarem-se da área rural para a urbana foi apenas uma questão de tempo para se fixarem, primeiramente, na cidade de Onda Verde, inicialmente por um pequeno comércio… que deu certo. Irem para Fernandópolis e se fixarem por lá, de vez, foi também consequência dessa maneira de pensar lhes passada pelo tio Yoshimi. Tanto, que ele próprio se mudou primeiramente para Novo Horizonte para depois se fixar em Barretos.
Conforme os sobrinhos foram crescendo e ficando pouco mais aliviados, a partir de certo momento, determinaram que a sequência seria aos mais velhos trabalharem para a formação educacional do mais novo, Paulo, que acabou se formando em medicina, na Universidade do Rio de Janeiro, sendo o primeiro universitário da família.
“Por isso a Família Sano, Brasil, tem muita gratidão ao tio Yoshimi que, com mãos de ferro, mas também de muito equilíbrio e foco na educação nos trouxe até o que somos hoje”, afirmação quase em uníssona da maioria da segunda geração.
Como foram os reencontros no Encontro
Lançada a ideia, conforme Paula descreveu acima, e abraçada a intenção de realmente realizá-lo, a impressão inicial era a de que realizariam apenas mais um evento com um determinado número de pessoas como já estavam acostumados. Mas com o advento da internet, com redes sociais de comunicação extraordinária, a adesão foi crescendo tanto que começaram a ficar preocupados em relação às acomodações e atividades aos participantes.
O alívio veio porque na cidade se localiza a Termas de Água Viva que, apesar de em reforma, possui estrutura razoável para receber número grande de pessoas de uma só vez. A comissão entrou em contato com a administração do hotel e, assim, ficou determinado.
Com exceção da sexta-feira, à noite, dia do Encontro Oficial que seria realizado no Clube Tóquio, as demais atividades seriam realizadas, todas, nos serviços e atividades que o hotel ofereceria, o que acabou ocorrendo, inclusive com uma grande churrascada exclusiva no restaurante do hotel.
O Encontro Oficial no Clube Tóquio
Apesar do atraso para se iniciar conforme programado, visto que a maioria vinha diretamente das Termas, tudo transcorreu dentro da normalidade até devido ao momento da inevitável confraternização.
Assim, a Mestre de Cerimônia, Célia Sano, abriu oficialmente o Encontro, saudando a todos, dando-lhes as boas-vindas e evidenciando muita satisfação por essa realização.
E deu início, ao chamar o primeiro convidado, Kazushi (Silvio Sano), filho caçula de Tsuneshi, para discorrer sobre a história da família Sano. Assim, igualmente saudando a todos, parabenizando a comissão organizadora por essa realização, Kazushi passou a narrar toda a história, com ênfase na origem do sobrenome, conforme descrita na sessão anterior, acima.
A seguir, cada família da primeira geração, representada por algum respectivo da segunda, ou terceira, tinha a incumbência de se apresentar e descrever quantas pessoas a compunha, de filhos netos, bisnetos a até trinetos, se fosse o caso.
Assim, um a um foram se apresentando: Tsuneharu, primogênito de Tsuneshi; Haruo, atual presidente do Clube Tóquio e filho de Tsuneo; Sayuri, neta de Tsunehiro; Célia, mestre de cerimônia nesse dia e filha de Sumeikissa; Kazuo, filho de Tamae; e, Flávio, primogênito de Paulo. Para finalizar essa sessão, Mário, terceiro filho do “tio Yoshimi”, discorreu sobre sua família e agradeceu pelo reconhecimento de todos ao papel marcante de seu pai à história dos Sano.
Antes da sessão seguinte, que seria aberta a quem quisesse acrescentar ou expor algo mais, Ricardo, marido de Yone, filha de Tsuneshi, pediu a palavra para falar em nome dos agregados… “como contribuinte 50% para essa grande prole existir”, com a concordância geral.
Na retomada à sessão aberta, apresentaram-se, mais uma vez, Haruo, Tsuneharu; depois, Midori, filha de Tsuneshi; Flávio, novamente; Saulo, neto de Tsunehiro; e, por fim, Paula, filha caçula de Paulo, a idealizadora do Encontro, muito aplaudida pela concretização do mesmo.
Para completar a noite foi servido pizzas em grande variedade e fartura, mas antes de as saborearem foi feito o tradicional brinde, dessa vez considerando como motivação a “homenagem de todos para todos”. Por isso ocorreu com muita vibração e emoção.
E como não poderia deixar de faltar em uma aglomeração grande de pessoas, após servidas as sobremesas, a vez dos aniversariantes do dia: Karen, bisneta de Tsuneo; Mitsue, filha de Tamae; e Sandro, neto de Tsunehiro, que veio do Japão onde mora e apesar de aniversariado no dia anterior.
Para finalizar a nobre noite, com todos muito à vontade e ainda se confraternizando, prosseguiram registrando fotos para a posteridade, ainda mais em tempo de alta tecnologia e redes sociais.
Parabéns à Família Sano pela realização desse Grande Encontro!
(texto: Silvio Sano – fotos: do próprio, de Kazue Takahira, Gabriel Sano Sugui, Leandro e Ariovânia Sano, Saulo Sano, Carla Sano Okubo e Tatiana Sano)
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