A primeira edição do FliMUJ – Festival Literário do Museu Judaico de São Paulo foi idealizada a partir do apreço pela pergunta, um traço tipicamente judaico, em uma tentativa de explorar as complexidades das questões contemporâneas brasileiras a partir da diversidade de pontos de vista. O festival de entrada gratuita, que acontece entre 6 e 9 de outubro, conta com a curadoria da dupla Fernanda Diamant, jornalista e editora, e Bianca Santana, jornalista, cientista social e pesquisadora, e tem confirmados os nomes de Sueli Carneiro, Noemi Jaffe, Allan da Rosa, Betty Fuks, Lira Neto, Natalia Timerman, Jerá Guarani, Nilton Bonder, a israelense Ayelet Gundar-Goshen, entre outros.
“Nosso primeiro festival literário se orienta pela metáfora do Museu Judaico de São Paulo: a trança entre povos, culturas e temporalidades. Assim, imaginamos o FliMUJ, junto às curadoras convidadas, como um festival que trança autoras e autores judeus e não judeus, perspectivas judaicas e não judaicas, brancas, negras e indígenas, normativas e não normativas, brasileiras e internacionais, que entrelaça passados, presentes e futuros como fenômenos vivos e, sobretudo, realça as luzes e as sombras do nosso tempo”, afirma o diretor executivo do Museu Judaico, Felipe Arruda.
Localizado no segundo subsolo do Museu, em um espaço com cenografia assinada por Stella Tennenbaum, o festival oferece ao público três mesas de debates por dia com temas que variam entre judeidade literária, culturas indígena e judaica, judeidade e negritude, religião e arte e democracia no Brasil. Os livros dos autores estão disponíveis para venda na tenda da Megafauna, dentro do Museu.
Na visão de Bianca Santana, “estamos precisando de mais possibilidades de interpretar o que está acontecendo no Brasil, ouvindo perspectivas aparentemente distantes em diálogo e nos fazendo novas perguntas, porque as usuais não têm dado conta. Esperamos que o primeiro Festival Literário do Museu Judaico de São Paulo permita bons encontros e nos provoque a imaginar, a partir da literatura, a democracia plena que ainda não experimentamos.”
O festival é antecedido pelo dia do perdão, – Yom Kipur – , data mais importante do calendário judaico. Logo após um período de reflexão profunda, e reconciliação com o sagrado e com as pessoas, o Museu inicia um evento literário em que escritoras e escritores farão perguntas entre si e para artistas e intelectuais de diferentes origens, crenças e campos do conhecimento. É também simbólico que, ao final do quarto dia de festival, comece Sucot, a Festa das Cabanas, que rememora tempos de nomadismo no deserto, da travessia da escravidão para a liberdade. Estamos disponíveis para um novo ciclo?
Para Fernanda Diamant, “É uma dupla felicidade fazer a curadoria do primeiro festival literário desse jovem Museu totalmente sintonizado com o presente, e em parceria com a Bianca Santana, que eu considero uma das mais instigantes intelectuais do Brasil”. Num momento crucial para a democracia no país, a primeira edição do FliMUJ coloca a pluralidade da cultura judaica em fricção com ela mesma e com o diferente para pensar temas caros à sociedade contemporânea, como a democracia, as identidades e o luto, entre outros.
Programação Completa
06 de outubro, quinta-feira, às 17h30
Cerimônia de abertura
06 de outubro, quinta-feira, às 18h
Existe uma judeidade literária?
A construção de identidade judaica na diáspora, as tradições religiosas e sociais, e a violência psíquica causada pelo trauma e pelo preconceito são insumos para a literatura e para a produção intelectual nos diferentes campos do conhecimento. Os reflexos das origens judaicas na obra de Clarice Lispector e na gênese da psicanálise — que tanto reverbera na produção literária contemporânea — são os pontos de partida desse encontro que inaugura o festival.
Betty Fuks e Yudith Rosenbaum, com mediação de Daniel Douek
06 outubro, quinta-feira, às 20h
Eretz tropical?
Pouca gente sabe que os judeus sefarditas são parte fundamental da história das Américas desde o século 17. A fuga das perseguições da Inquisição na Península Ibérica, a ocupação da ilha de Manhattan, a presença holandesa no Recife, os judeus marroquinos que imigraram para o Pará no século 19, os judeus-caboclos do ciclo da borracha serão algumas das histórias tratadas nessa conversa entre dois grandes escritores brasileiros.
Lira Neto e Márcio Souza, com mediação de Rita Palmeira
A mesa “Eretz tropical?” conta com a colaboração da livraria Megafauna
07 de outubro, sexta-feira, às 16h
A tchotchke virou tchutchuca?
A história singular das judias polonesas, conhecidas como polacas, forçadas à prostituição na primeira metade do século 20, mostra como essas mulheres criaram modos de sobreviver ao serem excluídas de sua comunidade. Elas, que não puderam ser enterradas dentro dos cemitérios judaicos, têm agora suas imagens projetadas na cúpula da antiga sinagoga que abriga este Museu, e abrem os caminhos para uma conversa sobre outras mulheres que ainda hoje têm suas existências ameaçadas e que ao mesmo tempo são agentes poderosas de seus destinos.
Amara Moira e Paula Janovitch, com mediação de Assucena
07 de outubro, sexta-feira, às 18h
Onde estão os guarani?
Por mais distantes que possam parecer à primeira vista, as culturas indígena e judaica, nas suas mais variadas manifestações, podem ser entrelaçadas em temas essenciais, tanto históricos quanto relativos a suas tradições. A relação com a terra é um deles, as perseguições e os projetos de extermínio são outros. Mas também a delicada relação com a música e as histórias transmitidas entre gerações. Nesta conversa, Timóteo Verá Tupã Popyguá, liderança guarani, autor do livro “A Terra uma só” — que conta seu aprendizado nos caminhos que percorreu junto ao seu povo Guarani Mbya — conversa com Renato Sztutman, antropólogo e professor da Universidade de São Paulo.
Timóteo Verá Tupã Popyguá conversa com Renato Sztutman, com mediação de Valéria Macedo
07 de outubro, sexta-feira, às 20H
Racismo e antissemitismo estão suficientemente narrados?
Contar os traumas – no divã, na literatura, no cinema, nas artes do corpo – é um caminho efetivo para processá-los, tanto individual quanto coletivamente. Na clínica psicanalítica e na literatura brasileira, como têm sido elaborados o racismo antinegro e o antissemitismo?
Maria Lúcia Silva e Noemi Moritz Kon, com mediação de Lilia Moritz Schwarcz
08 de outubro, sábado, às 11H
O Brasil foi algum dia a favor da democracia?
Em regimes autoritários, como as ditaduras vividas no Brasil, na Argentina e no Chile, o Estado viola direitos sob pretextos como garantir a segurança nacional. Regimes autoritários deixam sequelas, assim como a escravidão deixou. Mesmo em períodos democráticos, o Estado brasileiro impõe terror a parte expressiva de sua população, principalmente negra e indígena, uma das manifestações macabras herdada desse passado. Débora Maria da Silva, uma “mãe de maio”, que teve o filho assassinado em São Paulo no ano de 2006, e Roberto Simon, que contou em seu livro como a ditadura brasileira ajudou na derrubada da democracia chilena conversam sobre violência de Estado: presente, passado, futuro.
Débora Maria da Silva e Roberto Simon, com mediação da Thais Bilenky
08 de outubro, sábado, às 14h
O que vem depois da morte?
O mais recente livro da escritora Noemi Jaffe trata da morte de sua mãe, Lili, em fevereiro de 2020, aos 93 anos. Sobrevivente do Holocausto, Lili Jaffe era iugoslava e escreveu um diário relatando o que viveu em Auschwitz – publicado em 2012 com o título O que os cegos estão sonhando? Sua filha transcende seu relato brutalmente honesto sobre o luto e cria um grande elogio à memória. No judaísmo, assim como em tradições bacongo, a memória tem papel central. Tiganá Santana traduziu, em sua tese de doutorado, A cosmologia africana dos Bantu-Kongo, de Bunseki Fu-Kiau, além de ter produzido reflexões e diálogos com essa obra fundamental. Uma conversa entre Noemi Jaffe e Tiganá Santana, mediada pela professora Jerá Guarani, é uma oportunidade de entrelaçar acepções milenares do luto.
Tiganá Santana e Noemi Jaffe, com mediação de Jerá Guarani
08 de outubro, sábado, às 16h
E agora, para onde vamos?
Mulheres fundamentais para a redemocratização do país construíram alianças sem deixar de tratar das diferenças – e de aprender com elas. Desde o Conselho Estadual da Condição Feminina, criada em São Paulo na gestão Montoro, ao feminismo enegrecido dos dias atuais, mulheres como Eva Blay e Sueli Carneiro têm apontado caminhos percorridos coletivamente. Em um momento de tantas dúvidas e angústias, resta a certeza de que o futuro é feminino.
Sueli Carneiro e Eva Blay, com mediação de Bianca Santana
08 de outubro, sábado, 18h
Quer voltar para casa?
Thriller psicológico, romance histórico, autoficção. Duas escritoras da mesma geração, uma israelense e outra brasileira, ambas com formação também em psicologia conversam sobre o tratamento literário de temas como violência, machismo, alteridade, diáspora, imigração e integração. Como tratar de assuntos tão contemporâneos através da arte em tempos de cancelamento, afirmação política e sensibilidades à flor da pele?
Ayelet Gundar-Goshen e Natalia Timerman, com mediação de Fernanda Diamant
A mesa “Quer voltar para casa?” conta com a colaboração da Editora Todavia, Organização Sionista Mundial, Instituto Brasil-Israel, Consulado Geral de Israel no Brasil e Embaixada de Israel no Brasil.
09 de outubro, domingo, 11h
A sinagoga ficava na Abolição?
Os rios do centro de São Paulo correm fora do alcance dos nossos olhos. Quando chove demais, notamos sua presença fantasmagórica. Camadas de demolições e novos edifícios compõem o caótico palimpsesto de concreto. Dois especialistas na configuração desigual do nosso tecido urbano nos levam pela mão para um passeio pelo multifacetado entorno do MUJ no passado, no presente e nas possibilidades de futuro.
Raquel Rolnik e Allan da Rosa, com mediação de Fernanda Diamant
09 de outubro, domingo, às 14h
Onde se tocam religião e arte?
Tempo, memória, as relações entre o corpo físico e a espiritualidade, as expressões do sagrado são temas da produção artística e intelectual da poeta, ensaísta, professora e rainha de Nossa Senhora das Mercês, Leda Maria Martins, e do escritor, dramaturgo e rabino da Congregação Judaica do Brasil Nilton Bonder. A cultura brasileira, as tradições e filosofias judaicas e africanas se cruzam em uma conversa entre pensadores e artistas que ao mesmo tempo exercem papéis protagonistas na prática da religião.
Nilton Bonder e Leda Maria Martins, com mediação de Ilana Feldman
09 de outubro, domingo, às 16h
Rir pra não chorar?
Freud escreveu que o humor judaico seria uma forma de agressão sublimada das vítimas de perseguição. Outros dizem que a origem desse humor remonta a Abraão, informado por Deus de que Sarah teria um filho aos 91 anos. De todo modo, o humor pode funcionar como mecanismo de defesa contra injustiças ou possibilidade amigável de autocrítica. Levado a sério no judaísmo, ele se mistura com todos os gêneros artísticos e literários. Nem só de comédia vive o humor.
Luis Miranda e Michel Melamed, com mediação de Stephanie Borges.
Serviço
FliMUJ
Museu Judaico de São Paulo (MUJ)
Curadoria: Fernanda Diamant e Bianca Santana
Datas: de 06 a 9 de outubro
Local: Rua Martinho Prado, 128 – São Paulo, SP
Funcionamento: Terça a domingo, das 10 horas às 18 horas
Ingresso: Gratuito. Disponíveis pela Sympla.
Classificação indicativa: Livre
Acesso para pessoas com mobilidade reduzida
Acessível em libras
Tradução simultânea no dia 08 de outubro para a mesa com Ayelet Gundar-Goshen
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Sobre o Museu Judaico de São Paulo (MUJ)
Inaugurado em dezembro de 2021, é o maior museu judaico da América Latina, fruto de uma ampla mobilização da sociedade civil. O MUJ apresenta exposições permanentes sobre a cultura, os ritos, a memória e a história judaica no Brasil, bem como exposições temporárias de arte contemporânea de artistas judeus e não judeus. Os visitantes também têm acesso a uma biblioteca com mais de mil livros para consulta e a um café que serve comidas judaicas. Para os projetos de 2022, o MUJ conta com doação do Instituto Cultural Vale, Instituto CCR, Bemol, Sotreq, Fundação Arymax, Dexco e Alfa Seguros.
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